domingo, 6 de maio de 2018

BRIGAS

30-01-2012*
Sexta - feira
Ouviu o interfone.
Ela já estava esperando.
Não pensou em atender naquele momento. Já estava com tudo planejado e encaixotado. Não era uma caixa e sim uma caixinha. Na verdade caberia numa sacolinha de mercado. Isso mesmo. De ultima hora, enquanto ouvia novamente o interfone tocar ela mudou de ideia sobre a caixa de sapatos. Puxou uma sacolinha do puxa-saco que ganhou da tia Ana, bordado a mão, uma preciosidade guardando saquinhos de mercado, e encheu com as coisas dele.
Foi até a janela numa marcha decidida e lançou o saquinho no ar.
O coração batia forte. Mais de medo de atingir alguém do que sobre o que estava fazendo realmente. Mas tinha pensado sobre a hora que ele viria. E nessa hora não tinha ninguém na portaria. Os meninos e meninas que se reuniam ali pra tomar um tereré viriam mais tarde. Por isso jogou. Morava no terceiro andar e na sacolinha não havia nada de quebrar. Tinha o cd da Zélia Duncan mas ela não se importava se ele quebrasse; rachasse, riscasse, ou coisa semelhante. Se isso acontecesse seria bom, pois retrataria a sua alma. A mesma Alma que ele cantou tanto pra ela quando queria agradá-la..."Alma! Deixa eu ver sua alma. A epiderme da alma...Superfície! Alma! Deixa eu tocar sua alma Com a superfície da palma...Da minha mão...Superfície!"
A superfície agora era a do chão onde tudo se encontrava espalhado. Pôde ouvir o barulho seco. Correu pro interfone e disse: Pega aí suas coisinhas, faça bom proveito!
Sentou no sofá da sala e ouviu o interfone tocar mais duas vezes até que parou. Ela espiou pela janela e ainda viu o carro partindo. Olhou mais debruçada ainda pela janela. Não restava nada no chão. Ele recolheu tudo. Logo ele que detestava recolher coisinhas do chão. Que se dane!
Ela já tinha feito a mala dele, na semana passada. Colocou todas as suas coisas espremidas na mala maior. Tinham comprado antes daquela viagem pra Gramado no inverno, pra caberem os casacos. Foram felizes conhecendo Gramado, ela pensou. Foram felizes em muitos momentos. Mas essa felicidade foi se quebrando e no final já não tinham quase nada dela. É, a Dona Felicidade sabe ser muito frágil as vezes. Não suporta uma crise, nem duas e nem três.
Fez a mala dele com raiva. Mas achava que tinha colocado tudo.
Muito surpresa recebeu a cobrança três dias depois. Ele disse que havia esquecido o cd da Zélia, o meião e uma luva de futebol, uma correntinha antiga, umas fotos que a mãe tinha separado quando eles foram morar juntos, (ela também achava que seria pra sempre) e um boneco do Elvis que ganhou seiládequem num dia de seiláqueano...
Ele tinha esquecido também a Fidelidade que estava no fundo da gaveta e o "Amor pra Sempre" escrito no interior das alianças. Mas isso não ia na sacolinha. Na verdade ela tinha procurado por elas pela casa toda nos últimos meses. Mas começou a desconfiar que ela, a Dona Fidelidade se juntou ao Amor pra Sempre e de mãos dadas eles foram cantar em outra freguesia.
Sentou-se de novo no sofá.
Não podia deixar de pensar nele. Na verdade esperava que ele tocasse mais o interfone. Poxa, só duas tentativas. É isso? Ela não merecia uma tocadinha mais? Não merecia né. Mas o que ela queria, afinal? Ele ia falar o de sempre: que ela era doida. Isso ela já sabia.
Doida mesmo: primeiro doida de amor por ele. Depois doida de ódio e de ciume e por fim doida de tristeza por ver tudo acabar assim.
Foram tantos sorrisos, tantos beijos, tantas intimidades trocadas, conversas sem fim. Resolveram casar. Escolheram a data, a igreja, os padrinhos. Seis meses de namoro e seis meses de casados. Foram dias lindos e a felicidade parecia não ter fim.  
Mas acabou. Coisas gostosas acabam. É a vida.
Deu um pulo do sofá. O telefone. Levantou os olhos pro relógio e viu que sua amiga ligava bem na hora marcada. Devia estar sem unhas já de tanta curiosidade. Riu de tudo isso. Era o melhor mesmo por enquanto. Olhou sua expressão no espelho enquanto contava nos mínimos detalhes a trajetória da sacolinha lançada no vazio. Era uma expressão boa. Era uma mulher em pleno controle da sua vida ali no espelho. Se desse uma olhadinha a mais veria uma ruguinha no canto dos olhos. Mas não olhou. Quem disse que queria ver?
Terminou a conversa com a amiga, achando que ela ficaria mais satisfeita se tivesse visto um vídeo de toda a cena.  Mas de repente veio a lágrima. E outra e mais outras. Tentou deixar a mente vazia enquanto chorava. Não tinha chorado assim antes. Só umas lagriminhas que a raiva não segurou nos olhos. Então deixou chorar.Chorou tanto que ficou leve. Tão leve que adormeceu.
Quando acordou já era o outro dia. Sábado. E como dizem os mais velhos: nada como um dia atrás do outro. Estava bem disposta e com vontade de levantar como as atrizes nos filmes. Já reparou que nos filmes, elas acordam lindas -não era o seu caso, já que os olhos estavam inchados de chorar- prendem o cabelo num boné e saem pra correr numa malha linda? Pois é. Foi essa a vontade que ela teve. Colocou uma roupinha e partiu. Foi correr num parque cheio de recordações, mas e daí? Era aonde ela gostava e não ia se privar da visão das flores só por causa dos espinhos da sua vidinha agora sem graça. Tudo bem que esquecera o Mp3 e correr sem ele era o mesmo que ser manca. O que tinha que fazer então, era manter o foco nas coisas e pessoas que encontrava pela frente. Ninguém muito interessante. Só um cara com cara de recém-aposentado, algumas cheinhas tentando correr atrás do prejuízo...umas saradas ficando mais saradas, umas magrelas que não sei e não entendo porque andam no parque, só pode ser colesterol, Paiducéu!!
E volta completa, nervos restaurados e de volta pra casa. Ao entrar em casa, ela sentiu o cheiro dele. Impressão sua é claro, só pode ser, pensou ela numa fração de segundos. Impressão nada! Ele estava na sala! A chave que ficou no chaveiro do carro, claro sua burra, nem pra pedir de volta.
Sorriu. Mas ele não sorriu de volta pra ela. Estava abatido e com cara de doente.
- Tudo bem?
- Tudo sim, correndo né?
Agora sim, ele deu um sorrisinho. Meio de lado e mesmo ele falando o óbvio, ela disse que sim, com a cabeça.
-Porque você fez aquilo? Jogou minhas coisas pela janela. Tá doida?
Virou de costas pra ele com a desculpa de tirar o tênis enquanto pensava numa maneira de responder e sem entender o tom abafado da pergunta dele.
- Não. Não foi doideira, foi raiva. Mas já passou. Você veio me trazer a chave?
Ele não entendera a pergunta mas ela não iria repetir. Foi pra cozinha na esperança de respirar. Percebeu que não respirava desde que tirou o tênis. Pegou um copo e sentiu que ele andara pela cozinha. Havia um copo na pia. O pacote de bolacha estava na mesa remexido. Então ele chegara antes, bem antes dela.
- A gente precisa conversar. - disse - Vamos almoçar juntos?
Essa foi boa! Pegou ela de surpresa total. Continuou na cozinha fingindo por coisas no lugar, fugindo dos olhos dele. Sentiu uma canseira de repente, uma vontade de mandá-lo embora. Olhou pra ele, finalmente e disse:
-O que você acha que precisamos conversar? Você já não me disse tudo que queria?
Não queria ser agressiva nas palavras, mas também não queria bancar a tola. Ela lembrava muito bem das palavras dele antes de sair de casa: -"Você nunca acreditou em mim!" - "Eu sempre quis que desse certo" - e sorriu, porque como disse a Tati Bernardi: "E mesmo sorrindo por aí, cada um sabe a falta que o outro faz."
18-04-2013*
Ele sentou e ela não gostou de ver ele sentado ali, simplesmente como se estivessem a uns meses atras preparando coisinhas pra beliscarem diante da TV. Não gostou de ver a cena retroceder na sua cabeça como se fosse um filme chato. Teve vontade de mandar ele levantar. Estava incomodada e se sentindo invadida porque foi pega de surpresa. Odiava ser pega de surpresa e ver suas emoções saltarem primeiro. Voltem ja aqui emoções malditas nada de saltar pelos olhos agora...
Olhou pra ele e viu sua cabeça baixa.
- O que foi?
-O que foi é que não dormi  essa noite pensando em você e em nós. Pensando nos nossos projetos e nos nossos planos pra esse ano. Mas estou vendo que você dormiu bem, né...acordou disposta e foi ate correr. Acho que estou perdendo o meu tempo mesmo.- e se levantou.
Um raio percorreu o corpo dela. Ele quer voltar, reconsiderar, mudar? Será? E se ouviu dizendo: - Espera...
Ele parou para ouvi-la. E ela se pegou dizendo que não sabia o que seria dito de diferente mas que topava o almoço. Que horas e onde?
Tudo combinado e ele saiu.
Ela se pegou ansiosa. Ih...o que é isso? Ansiosinha  agora, nessa altura do campeonato? Sabe com quem você vai almoçar? Com aquele cara que você pegou de papo com outra no restaurante. Com aquele cara que deixou essa fulana pegar no braço que era seu. Na mão dela na perna dele, que era sua, na foto do churrasco da empresa...Naquela fulana que de repente estava sempre nos assuntos, sempre nos e-mails. No final daquele braço tinha um dedo com uma aliança e nela estava escrito seu nome. Então o braço era meu oras...
Reconsidere... calma.... pense na cara dele. Estava mesmo abatido. O que será que aconteceu? Será que ....será? Meu Pai o almoço. Ela tinha que se preparar pro almoço...já eram quase dez horas! Ao meio dia tinha que estar linda, leve e solta para encontra-lo....muito mais linda do que leve e solta!
Um banho! Era o que ela precisava no momento. a água lavaria essa adrenalina que dava choque nos seus nervos...tentou relaxar no chuveiro mas não conseguiu.
Não conseguia parar de pensar no que ele poderia querer conversar...tentou ser racional. Se já tinham acertado tudo e ele já até tinha levado a mala com suas coisas o que será que ele ainda tinha a dizer? Enquanto olhava o armário sem enxergar o que havia lá dentro pensava e pensava...não conseguia chegar a uma conclusão.
Será que ele queria passar uns dias no apartamento? Será? Na verdade ela sabia que ele detestava hotel, principalmente sozinho.E quem te garante tolinha, que ele está sozinho? - a vozinha estridente de algum ser do mal cantou nos seus ouvidos - Ai ai ai .... será que ele queria o apartamento pra ele? Será que tinha arranjado um advogado? Será que tinha entrado num curso de sapateado francês e se apaixonado pelo professor? Será que ia se mudar para o Japão e queria  emprestado seu livro de origami? Ou isso ou ele poderia ter se arrependido de ter saído de casa, saído da sua cama, da sua vida. Visto que ela era ELA ...a mulher de sua vida! Hummm, achou bom isso mas ficou com medo de ir por aí, por essa rua de pensamentos, porque sabia que se fosse por essa rua poderia se perder e não encontrar o caminho de casa. Poderia perder toda a sua dignidade quando ele olhasse pra sua cara e dissesse: " - quis te encontrar porque preciso que você hospede minha tia- vó- sobrinha- amiga- cadela...quem quer que fosse não faria diferença. Um dente dele quebrado, isso sim, faria toda a diferença. E a sua dignidade é claro, que escorreria pelo primeiro ralo que encontrasse.
Bom de que adiantava ficar se perdendo em pensamentos? " Bora" lá, vamos lá resolver esse desafio. Antes da calcinha , vista a coragem, porque sem ela você não dá um passo fora de casa. Aliás, sem calcinha também, afinal ainda era, ainda, uma mulher direita...Veste-se a coragem e mais o quê? Não há no mercado nenhuma revista de moda que te diga que ao se encontrar com seu ex, que pode voltar a ser seu futuro, use tons pastéis pára combinar com sua cara de pastel, quando ele te der o fora definitivamente. Use vermelho e seja fatal...Rosa para ficar romântica, quem sabe ele se lembra dos beijos trocados no inicio do namoro? Bom, nesse caso era melhor usar vermelho, preto, rendas e transparências... e a cama estava cheia de roupas disputando a sua escolha e ela ali pensando bobagens. Melhor ir neutra com cara de bem resolvida: calça jeans e uma camisa chic...e um salto médio, pra mostrar quem manda!
Na hora H nada de salto e nem camisa chique: ela tinha uma insegurança ao sair nervosa e de salto, porque sempre tinha a impressão de que cairia estabacada no chão. E camisa chic? Ah, fala sério! Ela eram muito mais ela mesma com uma básica...E foi. Não tinha mais volta.
Entrou no restaurante e seus olhos foram atraídos para onde ele estava sentado. Ele tinha um ar ansioso. Era inegável. Ele levantou e quase se beijaram na boca quando foram se cumprimentar. Ui que tenso isso. Ela estava tensa e ele também. Puxa! O que a cabeça pensa nessa hora não posso descrever agora. Estava de novo com aquela emoção pulsando no peito e vejam só: não estava zangada com ele...não estava mesmo.
Mas estava de basiquinha? Poxa, que ódio, ele estava lindo e bem vestido. E o cheiro? Ai que cheiro bom, a mesma loção de sempre, aquela que entrava pelas suas narinas e apertavam o botão do elevador direto para o subsolo da sua pessoa. Gente, isso foi golpe baixo e alguma coisa lhe dizia que tinha sido de propósito. Vamos, foco, mulher. Seja objetiva:
- Já pediu alguma coisa? Água? suco? Divorcio? Um soco na cara?
Ele disse que ainda não tinha pedido, esperava ela chegar para pedirem juntos. - ui ui ui - o garçom veio e tudo transcorreu normalmente. O pedido, o almoço, as frases feitas sobre o trabalho e as perguntas cretinas sobre o tempo e - não, obrigada, não quero sobremesa. - meu estômago não aguentaria mas nada que levasse açúcar. A conversa até ali estava melada demais. Afinal de contas o que era aquele almoço? Resolveu falar:

  - Olha Téo o que você quer conversar? Porque marcou esse almoço? - ela estava visivelmente nervosa e nem ia disfarçar.
-Você está nervosa, né...eu também estou, por isso não me apresse. Uma semana  inteira fora de casa, da nossa casa, longe de você. Acho que já fomos longe demais nisso. Por isso quis te ver, Fui hoje em casa pra isso, pra conversarmos, mas ao chegar lá vi você tão bem resolvida que não consegui falar. Preciso de você, preciso dessa chance para te provar que nada do que você viu tem fundamento.
  Ela ouvia sem coragem de interromper. Era se estivesse vendo um filme antigo e trocar de canal era impossível porque o controle da TV estava fora do alcance das mãos. Melhor deixar rolar.
E ele continuou:
  -Naquele dia fui pego de surpresa na empresa. Eu já sabia que ... -interrompi nesse momento dizendo que ele podia pular essa parte: ela já sabia. Ele já havia falado sobre a supervisora da filial do Rio de Janeiro, que não seria ele a recepciona-la e sim o Lúcio, seu companheiro de vendas, mas por causa de uma viagem súbita o Lúcio não estava naquele dia e ele havia sido designado a recepcionar no aeroporto, levar na empresa, levar pra almoçar, providenciar hotel e tudo que ela precisasse enquanto estivesse aqui. E que isso - palavras dele - não incluía um romance casual. As cariocas são muito diferentes. São mais soltas, mais atiradas. E que naquele bendito almoço ela falava e pegava nele como se fosse  a coisa mais normal. E que ele tinha ficado incomodado, mas não poderia ser grosseiro.- ela já sabia de tudo isso.
  -Sim, é verdade. Eu já te falei e você não acreditou em mim e me tratou como se eu fosse um namoradinho qualquer e não seu marido. Você não sabe o que eu senti quando você me acusou. Fiquei doido, cego. Você foi muito dura comigo, sem querer me ouvir, sem deixar eu falar. Eu passei esses dias pensando em tudo que vivemos e falamos ... nossa vida, nossas coisas e nosso casamento. Não acredito que você está indiferente a tudo isso. Preciso te falar que vou ao Rio, vou trabalhar uns dias por lá, mas não queria ir sem resolver nossa vida. E nesse momento ele quis pegar na mão dela. Sentir a mão dele na sua foi demais. Foi um choque elétrico. Nesse momento ela sentiu. Era a D. Saudade chegando. Veio em forma de calor e preencheu seu coração com um aperto forte. Mas espera. O que ele tinha dito? Ia viajar, resolver nossa vida... e de repente ela ouviu a voz dele dizendo que queria voltar pra casa. Ele continuou falando enquanto ela pensava. Falava que não podia imaginar que a vida deles juntos fosse acabar assim. Então ela tomou coragem e perguntou quando ele ia viajar. Ele disse que daqui 15 dias e ficaria uma semana trabalhando na filial do Rio de Janeiro. E você? Você não vai dizer nada?
Ela olhou pra ele com um olhar triste. Estava triste porque havia enxergado, de repente, ali sentada naquela mesa que o que havia separado eles estava tão distante, tão pequeno. E ao mesmo tempo tinha conseguido separá-los dessa forma. E ela não entendia o porquê. Só sabia que, do jeito que ele colocava as coisas a decisão era dela. Dependia dela refazer o laço, prender as pontas.
- Quero ir pra casa, ela disse. Preciso pensar.
22-04-2018*
Posso ir com você? - ele perguntou.
Ela já estava de pé e disse que não. Não dava pra pensar com ele no seu calcanhar. Não dava pra pensar com ele ali na sua frente. Não conseguia raciocinar. Sintia que se ele falasse mais alguma coisinha ela resolveria acreditar nele e aquela pulga maldita ficaria alojada em sua orelha, dormindo e que um dia acordaria para cutucar. O melhor a fazer era ir embora sozinha e pensar. Havia uma coisa que ela precisava entender.
Chegando em casa ela sentiu um vazio enorme. Aquele encontro abalara as suas certezas, as suas duvidas, abalara até o que ela não tinha sentido ainda. Ela estava dividida. O amor que sentia por ele veio tão forte que ela sentia que podia desmaiar a qualquer instante. De repente enxergou a dor que viu nos olhos dele, mas que na hora, não levou a serio. O orgulho foi maior. Lembrou do que prometeram um ao outro um dia antes do casamento. Aquela cena do restaurante a cegou completamente. Esquecera que ele era dela e ela dele. Ela sabia onde ele ia estar e fora lá para entregar a agenda dele. Sabia que ele ficava perdido sem ela, no trabalho e sabendo disso foi encontra-lo. E a cena que viu a desnorteou. Seu marido sentado num restaurante com uma mulher linda e bem arrumada, rindo com as mãos no braço dele.A mesma mulher que ela ja tinha visto em fotos sempre perto dele, da empresa. Aquela que o Téo ja tinha explicado que era de outro estado e que vinha a São Paulo supervisionar as vendas do Lúcio e as dele. Ela ainda tinha visto, na mesa, ele se afastar um pouco a ponto dela colocar a mão na perna dele. A cena foi rápida, mas bastou pra que ela partisse pro lado do garçom e pedido a ele que entregasse a agenda naquela mesa. Foi quando o Téo a viu e veio ao seu encontro surpreso e ainda disse pra ela que queria apresentar a tal fulana. Foi quando ela olhou na mesa e viu a fulana retocar o batom. Girou nos calcanhares e deixou ele ali sem resposta. Mais tarde quando ele chegou em casa, encontrou uma Ana doida, diferente da que ele conhecia. Transtornada, falando e acusando sem deixar ele falar e tudo se transformou e ela agora olhava pra cena como se estivesse de fora, observando as imagens de todos os ângulos e a compreensão veio como uma água morna num corpo cansado.
Como ela tinha sido cega. Como ela tinha deixado ele sair de casa? Feito a mala dele? Como?
Sentiu uma vontade imensa de sair correndo atras dele, mas não sabia em que hotel ele estava. Ligou no celular dele e ele atendeu logo.
- Téo, onde você está? Você pode vir aqui por favor?
- Posso sim Ana, estou indo...você ainda está nervosa? - Na verdade ele sentiu pela voz dela, que a sua Ana parecia estar de volta...
- Não meu amor, eu não estou nervosa. Quero que você voe...venha rápido.
- Você me chamou de meu amor, meu amor?
- Sim, ainda posso te chamar assim? Você ainda quer ser meu amor e me perdoar?
Pelo telefone ela ouviu a porta bater e a ligação caiu.
Ele ainda demorou meia hora pra chegar. A porcaria do trânsito de São Paulo. Mas chegou e ja encontrou ela chorando. Mas era um choro aliviado, diferente do choro dos últimos dias.


* Esse texto bobo começou a ser escrito em janeiro de 2012.
Foi recomeçado em abril de 2013. E depois abandonado.
Eu não tinha mais vontade de escrever depois da morte da minha irmã e da vinda da  mamãe pra minha casa. Abandonei o notebook e as historias bobinhas que eu escrevo.

(Escrito por Irma Brazil)